Para agradar à bancada ruralista, governo editou MP que permitirá refinanciamento de dívidas dos agricultores
O governo montou uma operação de guerra para votar, nesta quarta-feira, o texto final da reforma da Previdência na comissão especial que discute o tema na Câmara dos Deputados. Para garantir a vitória, o Palácio do Planalto atuou em várias frentes: começou a punir os deputados infiéis com as exonerações de indicações políticas, liberou emendas e escalou a tropa de choque comandada por ministros, líderes governistas dos partidos e parlamentares alinhados para fazer um corpo a corpo com todos os membros da base que integram a comissão. Também estão previstas algumas concessões pontuais.
Outra estratégia do governo para aprovar a reforma na comissão especial é a substituição de parlamentares. O deputado Eduardo Barbosa (PSDB-MG), por exemplo, será trocado pelo líder do PSDB na Câmara, Ricardo Tripoli (SP). O deputado foi atendido com as concessões nos benefícios assistenciais (Loas) pagos a idosos e deficientes de baixa renda, mas ainda resiste em votar com o governo. Segundo uma fonte, os parlamentares da base que continuarem indecisos serão substituídos.
Além disso, o governo preencheu com deputados aliados uma vaga que era do PR na comissão e outra do PEN. Agora, são 37 membros, com 23 a 25 votos favoráveis à reforma.
Para agradar à bancada ruralista, o governo decidiu editar na terça-feira uma medida provisória que permitirá o refinanciamento de dívidas dos agricultores com o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural) em torno de R$ 10 bilhões em até 180 meses (15 anos), com perdão de juros e multas. Também nesta quarta-feira, antes da votação, o Planalto deverá ceder ao lobby da Polícia Legislativa, que pede as mesmas regras de aposentadoria dos policiais federais, com idade mínima de 55 anos (homens e mulheres). O ajuste do relatório estava sendo acertado entre o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o relator da reforma, deputado Arthur Maia (PPS-BA).
Outro objetivo do governo com a MP é acalmar os grandes produtores, que sofreram uma derrota envolvendo o Funrural no Supremo Tribunal Federal (STF). Em março deste ano, a corte reconheceu a constitucionalidade da cobrança da contribuição do empregador rural pessoa física ao Fundo. Ela é calculada sobre 2% da receita bruta proveniente da comercialização da produção. A decisão do STF tem repercussão geral sobre 15 mil processos que estavam suspensos aguardando posicionamento. Os recursos do Funrural são destinados ao financiamento da seguridade social.
A bancada ruralista tentou negociar com o governo um perdão para as dívidas, mas a equipe econômica avaliou que não há espaço para abrir mão de recursos diante do desequilíbrio das contas públicas. Dados do Tesouro Nacional mostram que o déficit da Previdência Social somou R$ 21,7 bilhões no primeiro trimestre de 2017, com uma alta real de 3% em relação ao mesmo período de 2016. A projeção para o ano é que o rombo fique em R$ 188,8 bilhões.
O presidente da comissão especial que analisa a reforma da Previdência, Carlos Marun (PMDB-RS), descartou qualquer possibilidade de adiar a votação da proposta, marcada para começar nesta quarta-feira. Ele disse que não há essa necessidade e que tem “absoluta certeza” de que o texto será aprovado na comissão. Segundo Marun, com o projeto aprovado, o governo terá segurança para convencer parlamentares e sociedade e garantir os 308 votos necessários para aprovar o projeto em plenário:
“Não existe necessidade (de adiamento). Nós temos absoluta segurança de uma maioria consistente na comissão. O projeto já foi bastante ajustado, as sugestões dos parlamentares e da sociedade foram em sua maioria incorporadas ao texto, não existe motivo para mais adiamentos. Vamos hoje (terça) concluir a discussão e amanhã (quarta-feira) iniciaremos a votação.”
Marun afirmou que a base do texto que será votado é a mesma, mas não descartou mudanças. Ele disse que é uma prerrogativa do relator Arthur Maia alterar alguma “situação que passou desapercebida” até a votação da matéria na comissão.
A previsão é encerrar a votação até amanhã. Marun não quis arriscar um placar para a votação na comissão, mas disse que “gostaria de ter uma aprovação por 3/5”. Isso corresponderia a 22 votos favoráveis entre os 37 membros da comissão.
Em relação à votação em plenário, ele afirmou que caberá aos líderes e a Rodrigo Maia decidirem qual será o momento adequado para colocar o projeto em pauta. Questionado, ele afirmou que “seria irresponsável” da parte do governo não se preocupar com a aprovação do texto.
Os servidores públicos têm forte influência dentro da Câmara dos Deputados e vêm pressionando por mudanças no texto. Antes de começar a sessão da comissão especial que analisa o assunto, vários deles se aglomeraram na porta do plenário 2 da Casa, onde estava marcada a sessão, com gritos de “quem votar não vai voltar”.
Apesar da pressão dos servidores públicos federais e as perspectivas em torno de alguns ajustes para a Política Legislativa, o relator da reforma da Previdência disse na terça-feira que não vai alterar o texto no que diz respeito à categoria. O projeto limita a aposentadoria integral dos servidores que ingressaram antes de 2003 ao estipular uma idade mínima para ter esse benefício, de 65 anos para homens e de 62 anos para mulheres. O mesmo valeria para a paridade com os reajustes dados aos funcionários ativos.
Enquanto os deputados discutiam o texto da reforma da Previdência na Câmara, agentes penitenciários de várias partes do país invadiram o Ministério da Justiça em protesto por condições diferenciadas de aposentadoria na reforma que o governo tenta aprovar. Eles também reivindicam a aprovação de uma proposta de emenda constitucional de 2008 para tornar os servidores penitenciários profissionais da segurança pública, com uma estrutura de carreira nacional. A Polícia Militar do Distrito Federal estimou que a participação foi de 500 manifestantes.
Os agentes penitenciários permaneceram seis horas no local. A saída foi negociada por uma comissão de sindicalistas com o ministro da Justiça, Osmar Serraglio, que, segundo os representantes dos agentes, obteve de Rodrigo Maia o compromisso de ouvir a categoria para um eventual encaminhamento dos pleitos.
Créditos: Época