Num dos depoimentos que integram o seu acordo de colaboração judicial, o operador de propinas Lúcio Funaro confirmou à Procuradoria-Geral da República que recebeu dinheiro do empresário Joesley Batista, sócio da JBS, para não revelar atos de corrupção. Na segunda denúncia contra o presidente da República, por obstrução de Justiça, o procurador-geral Rodrigo Janot sustentará que Joesley comprou o silêncio de Funaro e do ex-deputado Eduardo Cunha com o aval de Michel Temer.
A notícia sobre o conteúdo do depoimento de Funaro foi veiculada pelo repórter Jailton de Carvalho no site do Globo. A Procuradoria vinculará as revelações do novo delator com a gravação da conversa que Joesley manteve com Temer no Palácio do Jaburu. Para os investigadores, ações compra compra da língua de Funaro estão insinuadas no seguinte trecho do áudio tóxico:
— Joesley – Como o senhor “tá” nessa situação toda do Eduardo (Cunha), não sei o quê, Lava-Jato..
— Temer – O Eduardo resolveu me fustigar, né. Você viu que..
— Joesley – Eu não sei, como tá essa relação?
— Temer – (inaudível) O (Sergio) Moro indeferiu 21 perguntas dele (Cunha) que não tinham nada a ver com a defesa dele, era para me trutar. Eu não fiz nada (inaudível)… No Supremo Tribunal Federal (inaudível).
— Joesley – Eu queria falar assim… Dentro do possível, eu fiz o máximo que deu ali, zerei tudo. O que tinha de alguma pendência daqui para ali (com Cunha), zerou toda. E ele (Cunha) foi firme em cima. Já tava lá, veio, cobrou, tal tal tal, pronto. Eu acelerei o passo e tirei da frente. O outro menino, companheiro dele que tá aqui, que o (ex-ministro) Geddel (Vieira Lima) sempre tava…
— Temer: Lúcio Funaro…
— Joesley: Isso… O Geddel que andava sempre ali, mas o Geddel perguntou, mas com esse negócio eu perdi o contato, porque ele virou investigado. Agora eu não posso também…
— Temer: É, é complicado, né, é complicado…
— Joesley: Agora, eu não posso encontrar ele.
— Temer: Isso é obstrução de justiça, viu?
— Joesley: Isso, isso… O negócio dos vazamentos, o telefone lá do Eduardo, do — Geddel, volta e meia citava alguma coisa meio tangenciando a nós, a não sei o quê. Eu tô lá me defendendo. Como é que, o que eu mais ou menos dei conta de fazer até agora. Eu tô de bem com o Eduardo…
— Temer: Tem que manter isso, viu?
— Joesley: (inaudível) Todo mês, também…
— Temer: É… (inaudível)
Preso na penitenciária brasiliense da Papuda, Funaro já havia confirmado os pagamentos de Joesley em depoimentos que prestara antes de se tornar delator. Mas ele alegava que se tratava da quitação de uma dívida antiga. Coisa referente à suposta intermediação de negócios da JBS. Acertada a delação, Funaro modificou a prosa, para declarar que, de fato, comercializara o seu silêncio.
A nova versão combina mais com os fatos, pois a irmã do operador de propinas, Roberta Funaro, foi filmada em 18 de maio recebendo R$ 400 mil em dinheiro vivo das mãos de Ricardo Saud, executivo da JBS. Se o pagamento fosse lícito, raciocinam os investigadores, teria sido feito de outra maneira.
De resto, a delação de Funaro orna com a situação penal do ex-ministro Geddel Vieira Lima. Ele responde a inquérito por ter procurado a mulher de Funaro para, por meio dela, convencer o marido preso a não enveredear pelo caminho da delação. Não colou.
A despeito dos esforços da Procuradoria, são escassas as chances de a Câmara autorizar o Supremo a investigar Temer. Os cargos e as verbas manuseadas pelo Planalto já não conseguem mobilizar uma maioria de 308 votos para aprovar matérias como a reforma da Previdência. Mas o governo ainda é capaz de seduzir os 172 votos de que precisa para evitar que os rivais de Temer levem ao painel da Câmara os 341 votos exigidos para levar adiante uma investigação criminal contra o presidente.
Créditos: Estadão