As pessoas não se preocupavam muito com a primeira refeição do dia até o século 19. Por que hoje em dia somos tão obcecados?
A maioria dos americanos está acostumada a ouvir que o café da manhã é a refeição mais importante do dia. Pule o café-da-manhã e uma série de coisas ruins vai acontecer: você vai comer demais no resto do dia, vai engordar, não vai conseguir se concentrar no trabalho ou na escola e vai ficar nervoso de fome.
Embora muita gente pense assim, uma outra corrente de pensamento vem ganhando força nos últimos tempos. Graças à moda do jejum intermitente, que sugere ficar sem comer durante até 16 horas do dia, o café da manhã está ficando de lado. E, como a refeição matinal, o jejum intermitente teria diversos benefícios de saúde, de reparação celular.
O café da manhã é importante ou não, afinal? Vamos ouvir o que a ciência e os cientistas têm a dizer.
O argumento a favor do café da manhã
A história do café da manhã é interessante. Até o século 19, as pessoas não se preocupavam muito com ele. A ideia era comer o que estava disponível, ou seja, as sobras da noite anterior. Mas uma “tempestade perfeita” elevou o café da manhã à condição de “refeição mais importante do dia”.
As mulheres começaram a entrar em peso para a força de trabalho no século 20, o que significa que elas precisavam de algo rápido e nutritivo para dar aos filhos antes de sair de casa. E, com a Revolução Industrial, as pessoas passaram a se preocupar com uma possível indigestão caso ficassem paradas durante muito tempo. A solução seria uma refeição saudável pela manhã. A religião também teve peso nessa mudança cultural. Na mesma época, a preocupação com a saúde levou gurus religiosos a abrir sanatórios, onde eram servidas refeições com pouco tempero e com muitos legumes e verduras. Os cereais da Kellogg’s, a propósito, foram criados em um desses sanatórios.
Talvez ainda mais interessante seja a história de um homem chamado Edward Bernays, que trabalhava para uma empresa chamada Beech-Nut. Bernays estava criando uma campanha para vender mais bacon. Ele pediu para 5 000 médicos assinarem um documento afirmando que um café da manhã pesado, à base de bacon e ovos, seria melhor que uma refeição leve. Aparentemente, os médicos decidiram assinar o documento com base somente nos poderes de persuasão de Bernay – de qualquer maneira, ele alcançou o objetivo de aumentar as vendas de bacon.
Hoje em dia, se você fizer uma busca por “estudos sobre o café da manhã”, o Google mostra página atrás de página de resultados. A refeição matinal fascina as pessoas há séculos. E, na maioria dos casos, as pesquisas apontam que o café da manhã é bem importante.
Um estudo publicado em 1999 na revista científica Physiological Behavior indicou que quem não toma café da manhã fica exausto por volta de meio-dia e tem desempenho pior em testes de memória. Outro estudo, de 2013, apontou que crianças de menos de 13 anos que não tomam café da manhã tinham resultados piores em testes em comparação com as crianças bem alimentadas pela manhã.
Um pequeno estudo publicado este ano indica que quem toma um café da manhã composto por mingau e leite apresenta melhor digestão, queima e metabolismo de carboidratos. No que diz respeito ao peso, um estudo de 2017 apontou que as pessoas que tomam café da manhã pelo menos quatro vezes por semana têm índice de massa corporal mais estável ao longo de cinco anos.
Benefícios de memória e de IMC podem não ser os únicos benefícios de um café da manhã completo: um estudo publicado na revista científica Appetite indicou que pular a primeira refeição do dia estaria associado à depressão, e um estudo de 2013 na revista científica Italian Journal of Pediatrics indicou que quem toma café da manhã tem melhores consumo de nutrientes e funções cognitivas.
A nutricionista Carolyn Brown, de Nova York, afirma que, em geral, é a favor do café da manhã. “Não precisa ser muito grande, mas o ideal é comer algo depois de acordar”, explica ela. “Recomendo aos meus clientes que comam algo até as 10h, uma regra que eu também sigo. As pesquisas mostram que ingerir proteína no começo do dia ajuda a evitar aquela fome do meio da tarde.”
O argumento a favor de tomar café da manhã mais tarde
E se você preferir comer um pouco mais tarde? Segundo algumas pesquisas, não há problema. Um estudo recente apontou que um espaçamento maior entre o jantar e o café da manhã (também conhecido como jejum intermitente é uma boa maneira de perder peso. Isso não significa tomar café da manhã muito mais tarde – só uma hora e meia depois do horário com o qual você está acostumado. É claro que hipoglicemia não é brincadeira, e atrasar demais essa refeição pode te deixar de mau humor ou exausto. O mais importante é prestar atenção no que o corpo está dizendo.
Brown acrescenta que, quando se trata de jejum intermitente, ela tipicamente recomenda adiantar o jantar, em vez de atrasar o café da manhã. “Em termos de jejum intermitente, acho que é mais importante deixar algumas horas entre o jantar e a hora de deitar do que tomar café-da-manhã mais tarde”, afirma ela.
O argumento a favor de pular o café da manhã
É claro que as pesquisas não concluem que o café da manhã é a solução de todos os seus problemas de saúde. Segundo um estudo publicado no American Journal of Clinical Nutrition, quem pula essa refeição pode queimar mais calorias ao longo do dia – embora também possa apresentar mais marcadores de inflamação no organismo. E, se seu café da manhã é exclusivamente composto por comidas cheias de carboidratos e açúcar, talvez seja melhor ficar sem comer nada. O consumo de açúcar já foi associado a sintomas de depressão, então melhor esperar para comer uma refeição que também contenha proteínas e gorduras saudáveis. Em outras palavras: um muffin no café da manhã talvez seja pior que não comer nada.
Brown afirma que, se você decidir pular o café da manhã, talvez seja o caso de dar um gás no café. “Sugiro acrescentar um pouco de óleo MCT (triglicérides de cadeia média) ao café. A maioria dos defensores do jejum intermitente concordam que, se você estiver consumindo menos de 50 calorias, ainda está em jejum. E o bônus é que essa adição vai te dar um pouco mais de energia.”
Marion Nestle, recentemente aposentada como professora de nutrição da Universidade de Nova York, quase nunca toma café da manhã. “Não sinto fome antes das 11h”, diz ela. “O que sempre fiz hoje em dia chamam de jejum intermitente. Acho que o que faz sentido é comer quando você sente fome.”
Brown concorda que cada pessoa funciona de um jeito diferente. “É uma questão que varia de acordo com o indivíduo, mas também tem a ver com o quanto você comeu na noite anterior, e a que horas. Ouça o que seu corpo está dizendo! E não use o café para enganar a fome.”
O café da manhã ideal
Então qual é o café da manhã ideal — independentemente da hora em que você vai comer – em termos de energia e concentração? Brown sugere proteínas e gorduras saudáveis sempre que possível. “Tento incluir alguma verdura ou legume também”, diz ela. “Meu café-da-manhã predileto tem dois ovos, com meio abacate e algum legume, acompanhado de suco verde com proteína vegetal ou colágeno, iogurte grego ou de coco integral, com frutas e sementes de chia, ou então um pão integral ou sem glúten. São muitas opções saudáveis e deliciosas!”
Nestle recomenda simplesmente certificar-se de que todos os nutrientes importantes estão ticados. “Se você olhar para o que se come no café da manhã ao redor do mundo, as diferenças são enormes”, explica ela. “Toda refeição deveria oferecer uma variedade de alimentos relativamente pouco processados, que supram as necessidades nutricionais e energéticas. Há muitas maneiras de fazer isso com comidas de que você gosta.”
Fonte: Huff Post Brasil