Com alíquotas ainda indefinidas, fica difícil dizer se preços vão baixar, diz economista

A reforma tributária em discussão no Senado Federal após aprovação na Câmara dos Deputados pode mexer no mercado automotivo, mas o cenário ainda é nebuloso. Isso porque ainda não há definição de alíquotas e regras para cada setor.

Em linhas gerais, a reforma aprovada até agora substitui cinco impostos pelo chamado IVA Dual (Imposto sobre Valor Agregado) em duas esferas:

  • Impostos federais: substitui IPI, PIS e Cofins pelo CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços)
  • Impostos estaduais e municipais: troca ICMS e ISS pelo IBS (Imposto sobre Bens e Serviços).
  • Também é criado o imposto seletivo sobre produtos prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.

Além disso, cria créditos para impostos já pagos ao longo da cadeia produtiva, eliminando a prática que é conhecida como impostos em cascata.

Usando como exemplo um parafuso usado na fabricação de uma peça de carro que tenha alíquota de 10%:

  • O produtor de aço vende o insumo por R$ 100 para uma fábrica. A fábrica recolhe R$ 10 em imposto;
  • A fabricante do parafuso vende o produto manufaturado por R$ 200 para a empresa que produz a peça, que recolhe imposto de R$ 20. Desdes, R$ 10 ficam de crédito, já que R$ 10 já foram recolhidos na fase anterior.
  • O consumidor compra o produto final por R$ 300, ou seja, paga R$ 30 de imposto. A loja tem R$ 20 de crédito.
  • Antes da reforma, algumas taxas acumulariam, já que impostos que serão extintos não geram créditos.

As regras para cada setor serão criadas depois por leis complementares. O mercado automotivo tem particularidades, como faixas de impostos conforme a motorização, que varia de 7% para carros até 1.0 e vai até 25% para carros a gasolina com motor maior de 2.0.

Sem definição das alíquotas, é difícil saber se os carros vão ficar mais baratos — Foto: Shutterstock

O preço do carro vai cair?

Sem a definição das alíquotas, é difícil saber se a reforma tributária vai ou não baixar os preços dos carros.

O discutido hoje é que essas camadas sejam estabelecidas pelo consumo energético, ou seja, carros que poluem menos, pagam menos. Mas, saindo do campo da especulação, seria necessário esperar ao menos até 2025 para ter alguma definição.

O certo é que a reforma tributária diminui a burocracia, e isso é comemorado por fabricantes e economistas.

“Tudo vai depender da alíquota de calibração. Ainda não se tem, então trabalhamos com diversos cenários. Em cada um você tem algum segmento que perde e outro que ganha, mas, no geral, não se espera uma redução da carga tributária, mas sim nos gastos administrativos”, diz Márcio de Lima Leite, presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea).

Economia de R$ 4 bi com burocracia

Pelas contas da entidade, 1,2% do faturamento da indústria automotiva é gasto com burocracia tributária, o que giraria em torno de R$ 4 bilhões. “Isso poderia ser revertido em investimento e formação das pessoas”, continua Leite.

“A redução do tempo que você vai perder para poder arrecadar impostos é um ganho de produtividade. Um dos pilares [da reforma] é a simplificação. A arrecadação fica mais simples, a cadeia produtiva vai perder menos tempo. Esse é o grande foco”, afirma Carla Beni, economista e professora de MBAs da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

A economista antecipa, no entanto, um cenário positivo para o setor. “Existe a reforma ideal e a possível. Estamos vendo uma extremamente positiva, mas também dentro do possível.”

A associação dos fabricantes também vê na reforma uma porta para investimentos externos. “Nós acreditamos, sim, em aumento dos investimentos, em previsibilidade e amadurecimento do país. De uma forma geral, estamos celebrando a aprovação. Isso é um sinal de amadurecimento do Brasil e da sociedade”, disse o presidente da entidade.

Segmento de usados defende tratamento diferenciado em relação ao mercado de carros novos — Foto: Arquivo Pessoal

E os usados?

Indefinição também é vista pelo segmento de carros usados. Segundo Alcides Wilhelm, assessor jurídico da Federação dos Revendedores de Veículos Usados (Fenauto), ainda não dá para saber o reflexo que a reforma terá no setor.

“Pela forma que está sendo desenhado o CBS, se o setor de veículos usados não estiver contemplado com a possibilidade de ter créditos presumidos, haverá um aumento significativo nos preços”, disse.

Wilhelm defende que o setor seja tratado de forma diferente do mercado de novos. “Como a PEC 45 que passou está posta, vejo que a carga tributária deve ficar mais alta.”

“Seria importante o segmento pressionar os nossos legisladores para que contemplem alguma forma de tributação diferenciada para evitar um aumento de carga tributária. A gente não pode deixar que a reforma trate todos os contribuintes de forma igualitária, sendo que cada segmento econômico tem as suas particularidades”, conclui.

IPVA

Outro ponto da reforma tributária que interessa aos donos de carros é a mudança no Imposto sobre Propriedade de Veículo Automotor (IPVA), que passa a ser progressivo. O discutido é que a base de cálculo leve em conta dois pontos: a eficiência energética e o valor dos carros.

Se passar dessa forma, veículos elétricos e híbridos pagariam menos, e carros a combustão mais caros teriam alíquotas mais altas. As taxas serão fixadas posteriormente, por meio de lei complementar. Atualmente, há iniciativas pontuais de estados e municípios nesse sentido. Com a mudança, pode haver uma única regra para todo o país.

Também foi aprovada a cobrança do imposto para embarcações e aeronaves, mas já há projetos de isenção para veículos utilizados na agricultura e na pesca, o que abriria brechas para outras categorias. Ou seja, até o início da implementação, prevista para 2025, muita água ainda vai rolar.

Fonte: Auto Esporte