O debate no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que pode cassar o mandato do presidente Michel Temer deve ser norteado pelo artigo 23 da lei que trata da inelegibilidade. Todas as apostas no meio jurídico são de que o ministro Herman Benjamin, relator do processo, deve usar esse trecho da lei para respaldar o uso dos depoimentos de executivos da Odebrecht e do marqueteiro do PT João Santana e sua mulher Mônica Moura para justificar seu voto.
Os depoimentos incriminam mais a chapa Dilma-Temer do que a denúncia que deu origem ao processo. É nesse ponto que entra o artigo 23 da lei 64/90, prevendo que o juiz pode levar em consideração fatos ainda que não narrados pelas partes. O debate será sobre a abrangência do artigo. O relator poderá citar fatos que sequer foram mencionados na acusação ou deve utilizar apenas informações que foram ventiladas na peça inicial?
Diz o artigo 23: “O Tribunal formará sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando para circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público de lisura eleitoral”.
A petição inicial apresentada pelos tucanos tratava inicialmente da ocultação de dados negativos da economia por parte de institutos oficiais, como o Ipea e o IBGE, o suposto uso de propaganda pela chapa em período vedado e o recebimento de doações de empreiteiras contratadas pela Petrobrás. Tudo isso, segundo o PSDB, desequilibrou a eleição de 2014 a favor da chapa vencedora.
Com o avanço da Lava Jato, depoimentos de delatores foram incluídos no processo pelo ministro Herman Benjamin. Ao TSE, disseram que houve o uso de caixa dois na campanha e detalharam a compra de apoio de partidos para integrar a chapa e garantir mais tempo de televisão para a campanha. Esse ponto, segundo ministros e advogados, é um dos mais delicados para o presidente Michel Temer, já que beneficiou a chapa como um todo.
A defesa de Temer vai tentar, em um primeiro momento, restringir o entendimento sobre o artigo 23 da legislação eleitoral para evitar que os depoimentos de delatores sejam levadas em conta no processo. Se vencer essa tese, aposta que consegue livrar o presidente de uma condenação porque os fatos da inicial não justificariam a punição.
O Planalto estima que, nessas condições, serão 5 votos pela absolvição e apenas 2 pela cassação de Temer, que viriam do relator e da ministra Rosa Weber. Os menos otimistas apostam no 4 a 3.
Se perder a queda de braço, os advogados vão alegar que delação premiada não é prova definitiva, uma vez que ela apresenta caminhos de prova. “A linha de chegada do TSE é a linha de partida do STF. Não tem sentido”, diz um interlocutor do Planalto.
Benjamin guarda seu voto a sete chaves. Mas a posição do ministro em outros processos tem demonstrado que será pela cassação da chapa.
O voto do ministro já deve indicar a solução a ser tomada em eventual cassação do mandato de Temer. Recente julgamento que cassou o mandato do governador do Amazonas levantou dúvidas se ele adotaria o mesmo raciocínio, para determinar a realização de eleição direta no País. O entendimento, na ocasião, foi o de que o TSE estava anulando a eleição ao considerar que ela foi contaminada por abuso de poder. Por isso, os votos dos eleitores não seriam contabilizados, o que permite a realização de nova eleição. Caso se repita esse cenário, só haveria uma maneira do presidente evitar a eleição direta: renunciar ao mandato antes de ser notificado pela Justiça Eleitoral. Só a renúncia permitira, por esse entendimento, a eleição indireta. Pela eleição indireta, o novo presidente será escolhido pelo Congresso, o que agrada mais ao atual grupo político que comanda o País.
A delação de Joesley Batista, que atinge o presidente Temer, não tem relação com o processo no TSE. O uso do fato, mesmo que para contextualizar, fragilizaria o voto do relator, avaliam ministros e advogados. (Colaborou Naira Trindade).
Créditos: Estadão