Polícia Federal encaminhou um documento adicional ao relatório final entregue ao Supremo no fim de novembro

A Polícia Federal (PF) encaminhou ao Supremo Tribunal Federal (STF) um complemento ao relatório final do inquérito sobre o plano de golpe de Estado que foi supostamente articulado no fim de 2022. O documento traz o indiciamento de outros três militares. São eles: o tenente Aparecido Andrade Portela, o coronel reformado Reginaldo Vieira de Abreu e o tenente-coronel da ativa Rodrigo Bezerra de Azevedo.

A PF imputou a eles os crimes de golpe de Estado, tentativa de abolição violenta do Estado de Direito e associação criminosa, assim como às outras 37 pessoas indiciadas anteriormente. A lista incluía o ex-presidente Jair Bolsonaro; o ex-ministro da Defesa e da Casa Civil Braga Netto; o presidente do PL, Valdemar Costa Neto; o ex-ajudante de ordens Mauro Cid; o deputado federal Alexandre Ramagem; o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) Augusto Heleno; entre outros.

Os militares só foram indiciados hoje porque eles ainda não haviam prestado depoimento quando a PF enviou o relatório ao Supremo, no fim de novembro. A legislação impede que investigados sejam responsabilizados criminalmente antes de serem ouvidos pelas autoridades.

Em depoimento, Portela e Abreu ficaram em silêncio. Bezerra, por sua vez, negou participação no plano golpista.

Tenente Portela

Mais conhecido como tenente Portela, Aparecido Andrade Portela foi eleito em 2022 como primeiro suplente da senadora Tereza Cristina (PL-MS), que foi ministra da Agricultura no governo Bolsonaro. Amigo do ex-presidente, Portela é apontado pela PF como um “intermediário” entre o Palácio do Planalto e financiadores de acampamentos golpistas montados na frente de quarteis no Mato Grosso do Sul.

“PORTELA era um frequentador assíduo do Palácio do Alvorada, visitando o então presidente da República constantemente”, diz o relatório da PF, referindo-se a 13 visitas que ele fez à residência presidencial em dezembro de 2022.

A PF encontrou mensagens trocadas entre Mauro Cid e Portela que tratam sobre a “colaboração da carne” aos acampamentos. Segundo a PF, ele usava o codinome “churrasco” para se referir ao patrocínio de atos antidemocráticos.

Portela é próximo de Bolsonaro desde a época em que eles serviram no Exército na cidade de Nioaque (MS) na década de 70, conforme as investigações.

“Por fim, os elementos de prova evidenciaram que além de arrecadar recursos e sugerir linhas de ações para atuação, TENENTE PORTELA também apresentava preocupação de que pudesse ser identificado por outros usuários de redes sociais como um dos organizadores dos atos criminosos ocorridos em 08/01/2023”, completa a PF, dando a entender que ele também teria envolvimento nos atos golpistas de 8 de janeiro.

Coronel Reginaldo de Abreu

Coronel do Exército, Reginaldo de Abreu, apelidado de Velame, era o chefe de gabinete do então secretário-executivo da Secretaria-Geral da Presidência general Mário Fernandes durante a gestão Bolsonaro. Fernandes é apontado como o responsável por elaborador e imprimir um plano para assassinar o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o vice Geraldo Alckmin. A trama era intitulada de “Punhal Verde e Amarelo”.

Segundo a PF, Abreu “auxiliou” o general a “tentar disseminar” informações falsas sobre o processo eleitoral de 2022 no qual o presidente Lula saiu vencedor. Logo após o segundo turno daquele ano, ele levou um hacker para prestar depoimento à superintendência da PF no Distrito Federal, com o objetivo de descredibilizar as urnas eletrônicas. A iniciativa não foi adiante, porque a PF não deu atenção às denúncias.

Conforme as investigações, Abreu tentou “manipular” o relatório de fiscalização feito pelas Forças Armadas sobre as urnas eletrônicas. Ele sugeriu que o documento fosse “alinhado” com as conclusões do argentino Fernando Cerimedo que disseminou teses falsas sobre o processo eleitoral brasileiro.

Um usuário vinculado ao militar também foi o responsável por imprimir um documento chamado de “Gab_Crise_GSI.doc”. Segundo a PF, o gabinete seria instituído após a realização de um golpe de Estado e seria coordenado por Augusto Heleno.

Os investigadores identificaram que o militar ainda tirou uma foto do ministro do STF Gilmar Mendes embarcando no aeroporto de Lisboa com destino à Brasília.

“Importante contextualizar que a foto foi enviada no mês de novembro de 2022, no período em que os investigados tinham elaborado a primeira versão da minuta de golpe de Estado que previa, dentre outras medidas de exceção, a prisão do ministro GILMAR MENDES, conforme depoimento prestado pelo colaborador MAURO CESAR CID”, afirmou a PF.

Tenente coronel Azevedo

Militar da ativa, o tenente coronel Rodrigo Bezerra de Azevedo acionou um celular que fazia parte do grupo “Copa2022” na plataforma Signal. Segundo as investigações, nesse chat secreto, os participantes se articularam para monitorar e emboscar o ministro do STF Alexandre de Moraes, em 15 de dezembro de 2022. A ação acabou sendo “abortada” por um usuário que ainda não foi identificado.

“Tais elementos de prova demonstram o vínculo objetivo entre o investigado RODRIGO BEZERRA AZEVEDO e o aparelho celular e o número de telefone utilizados na ação clandestina realizada no dia 15/12/2022, na cidade de Brasília para prender/executar o ministro ALEXANDRE DE MORAES”, diz o relatório da PF.

Em depoimento à PF, Bezerra afirmou que não estava na capital federal no dia da suposta emboscada e que só pegou o celular na base do Exército alguns dias depois. Ele negou ter participado de qualquer plano que visava prender Moraes. Os investigadores, no entanto, destacaram que não há nenhum documento formal que comprove a retirada do aparelho no fim de dezembro.

“Apesar de ser um bem público, pertencente ao Exército brasileiro, RODRIGO AZEVEDO alegou que o Copesp não tem um controle sobre a retirada dos aparelhos celulares, fato que impede a confirmação de sua alegação de que retirou o aparelho após a ação clandestina do dia 15/12/2022”, afirma o relatório da PF.

O celular pertenceria ao Comando de Operações Especiais (Copesp) de Goiânia e era utilizado em missões sensíveis, segundo o militar.

“Isso aí é uma prática que acaba sendo feita, a gente que trabalha com missões sensíveis, de anonimizar o celular realmente. Minha intenção era ter esse celular para anonimizá-lo realmente”, disse o militar, na oitiva, apontando os motivos pelos quais o celular estava no nome de um terceiro.

Azevedo fazia parte do batalhão de Forças Especiais do Exército, os chamados “kids pretos”, que são especializados em técnicas de sabotagem, insurgências populares e contra-terrorismo. Dos três novos indiciados, ele é o único que continua preso preventivamente.

Fonte: Globo.com