Com propósitos de aliviar o sistema prisional, se contrapor a uma rigidez do Judiciário e promover a reconciliação ou a paz, os indultos também têm sido alvo de polêmicas em diferentes países.

Definido como ato de clemência estatal, que extingue ou atenua a pena de condenados, o indulto existe há séculos e é característica de muitas democracias contemporâneas, mas possui diferentes mecanismos e entendimento.

No Brasil, o instrumento é de competência do presidente da República, que tradicionalmente publica decretos sobre o tema no mês de dezembro. O costume tornou a medida conhecida como indulto de Natal.

Neste ano, o indulto foi transportado novamente para o centro das atenções após o presidente Michel Temer assinar polêmico decreto que o deixava mais generoso. A medida não acolheu recomendações feitas pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária – ligado ao Ministério da Justiça- e recebeu críticas de entidades e promotores da Lava Jato, que afirmam que as mudanças beneficiam corruptos.

Nesta quinta (28), a ministra do STF Cármen Lúcia suspendeu trechos do decreto, e o governo deve elaborar nova versão para o texto.

INDULTOS PELO MUNDO

Dias antes, indulto concedido ao ex-presidente do Peru Alberto Fujimori também provocou reações e desencadeou uma série de protestos pelo país. Manifestantes pedem que ele cumpra toda a pena de 25 anos -Fujimori foi condenado por crimes de corrupção e contra a humanidade durante a sua gestão (1990-2000).

De acordo com relatório elaborado em outubro pela ONG anticorrupção Transparência Internacional, a impunidade, ou a falta de punição apropriada, é um dos efeitos dos indultos e clemências para crimes relacionados à corrupção.

“Se funcionários públicos sabem que podem ser absolvidos de qualquer punição, eles têm mais incentivos para cometer atos de corrupção no futuro. Uma impunidade sistêmica pode ter um efeito catalisador para a corrupção e o crime em um país”, diz trecho do documento. “O uso excessivo de indultos para crimes de corrupção pode desmotivar ou deter promotores que investigam esses casos.”

Nos EUA, o assunto ficou em evidência em diversas ocasiões, incluindo quando os ex-presidentes Jimmy Carter e George H. W. Bush concederam indultos que beneficiaram autoridades ligadas a escândalos, como o Watergate, que derrubou o presidente Richard Nixon.

Depois, o indulto voltou a receber críticas no país norte-americano após os ex-presidentes Bill Clinton e George W. Bush usarem a medida para perdoar membros de sua própria equipe que eram acusados de corrupção.

Na Nigéria, em decisão também contestada pela população, o ex-presidente Goodluck Jonathan concedeu clemência ao ex-governador Diepreye Alamieyeseigha, que havia sido condenado por roubar milhões de dólares. Alamieyeseigha ainda voltaria a ter permissão para se candidatar e recuperou propriedades que haviam sido confiscadas durante o seu julgamento.

Na França, o Parlamento também teve decisão polêmica ao aprovar em 1988 anistia que inocentou diversas pessoas acusadas de irregularidades no financiamento de campanhas políticas.

DIFERENTES MECANISMOS

O poder de clemência estatal pode ser responsabilidade exclusiva do chefe de Estado ou relegada a uma instituição especializada do Poder Executivo. No Reino Unido, por exemplo, o Home Office – órgão equivalente ao Ministério da Justiça- é o responsável por conceder, ou não, indultos.

Assim como no Brasil o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária faz recomendações sobre o indulto ao Executivo, outros países também têm entidades especializadas que indicam procedimentos de clemência, quando a responsabilidade é exclusiva do chefe de Estado.

Na Rússia, segundo a Transparência Internacional, um conselho de 15 membros composto por juristas, artistas e escritores revisa penas e envia súplicas de clemência ao presidente.

Para tornar os indultos mais eficientes, vários países têm elaborado reformas, como aumentar o número de autoridades que participam de decisões sobre indulto; outras mudanças visam limitam o seu poder, ampliando a transparência.

Entre as diferentes finalidades, os indultos também são aplicados para estabelecer a ordem pública em períodos de transição de governo.

A clemência concedida pelo Estado pode se enquadrar em outras categorias como a anistia, que pode ser exemplificada com o acordo entre governos da América Latina e membros de ditaduras militares ou grupos insurgentes durante as décadas de 70, 80 e 90.

PARA RECEBER O INDULTO

O que diz o decreto de número 9.246 de Temer?

O item mais controverso contempla quem tenha cumprido um quinto da pena, se não reincidentes, e um terço da pena, se reincidentes, nos crimes praticados sem grave ameaça ou violência à pessoa independentemente do tempo total de condenação.

Como era antes?

O preso deveria ter sido condenado a, no máximo, 12 anos prisão e, caso não fosse reincidente, já ter cumprido o equivalente a um quarto da pena nos crimes praticados sem grave ameaça ou violência à pessoa.

O que o decreto mudava?

A principal mudança estava no tempo máximo de condenação exigido; o decreto tornava mais generosos os critérios para um presidiário receber a extinção da pena.

Polêmica

A medida não acolheu recomendações feitas pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária e recebeu críticas de entidades e promotores da Lava Jato.

Próximos passos

Com a suspensão do decreto determinado pelo STF, ainda não está claro qual será o tempo de pena exigido para que se conceda o indulto nos casos atacados pela PGR.PERGUNTAS E RESPOSTAS

O que é o indulto?

É um ato de clemência estatal que pode ser total ou parcial. No Brasil, é de competência exclusiva do presidente da República, segundo o artigo 84 da Constituição.

Quem poderá ser contemplado com o indulto?

O preso que tenha cumprido os prazos para o benefício, à exceção de pessoas que tenham cometido crimes hediondos, de tortura e terrorismo.

O que a PGR contesta?

A procuradora-geral, Raquel Dodge, alegou que chefe do Executivo não tem poder ilimitado de conceder indulto. Segundo ela, o texto é o “mais generoso” das últimas décadas e coloca a Lava Jato em risco.

O que a presidente do STF, Cármen Lúcia, decidiu?

A ministra suspendeu os efeitos de três artigos, entre eles o que concede o indulto, genericamente, a quem cumpriu um quinto da pena, se não reincidente, e um terço da pena, se reincidente, nos casos de crime sem grave ameaça.

Créditos: Notícias ao minuto